domingo, 31 de julho de 2011

Oswaldo Montenegro - Lua e Flor

Diga-me uma coisa: dá para não flutuar com essa flauta???

Pouco importa se acreditam em mim ou não.
Eu sei a verdade que carrego comigo.

Nina Oliver
Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.

E então serás eterno.

 Cecília Meireles

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Hoje em dia, a crítica moderna usa o adjetivo "adulto" como marca de aprovação. Ela é hostil ao que denomina "nostalgia" e tem absoluto desprezo pelo que se chama de "Peter Panteísmo". Por isso, em nossa época, se um homem de cinqüenta e três anos admite ainda adorar anões, gigantes, bruxas e animais falantes, é menos provável que ele seja louvado por sua perpétua juventude do que seja ridicularizado e lamentado por seu retardamento mental.



[Mas] os críticos para quem a palavra “adulto” é um termo de aplauso, e não um simples adjetivo descritivo, não são nem podem ser adultos. Preocupar-se em ser adulto ou não,
admirar o adulto por ser adulto, corar de vergonha diante da insinuação de que se é infantil: esses são sinais característicos da infância e da adolescência. E, na infância e na adolescência, quando moderados, são sintomas saudáveis. É natural que as coisas novas queiram crescer. Porém, quando se mantém na meia-idade ou mesmo na juventude, essa preocupação em “ser adulto” é um sinal inequívoco de retardamento mental. Quando eu tinha dez anos, eu lia contos de fadas escondido e ficava envergonhado quando me pilhavam. Hoje em dia, com cinqüenta anos, leio-os abertamente. Quando me tornei homem, deixei para trás as coisas de menino, inclusive o medo de ser infantil e o desejo de ser muito adulto.A visão moderna, a meu ver, envolve uma falsa concepção de crescimento. Somos acusados de retardamento porque não perdemos um gosto que tínhamos na infância. Mas, na verdade, o retardamento consiste não em recusar-se a perder as coisas antigas, mas sim em não aceitar coisas novas. Hoje gosto de vinho branco alemão, coisa de que eu tenho certeza de que não gostaria quando criança; mas não deixei de gostar de limonada. Chamo esse processo de crescimento ou desenvolvimento, porque ele me enriqueceu: se antes eu tinha um único prazer, agora tenho dois. Porém, se eu tivesse de perder o gosto por limonada para admitir o gosto pelo vinho, isso não seria crescimento, mas simples mudança. Hoje em dia já não gosto somente de contos de fadas, mas também de Tolstói, Jane Austen, Trollope, e chamo isso de crescimento; se tivesse precisado deixar de lado os contos de fadas para apreciar os romancistas, não diria que cresci, mas que mudei.

C.S. Lewis

Alice retrucou, bastante timidamente: 
"Eu - eu não sei muito bem, Senhora, no presente momento - pelo menos eu sei quem eu era quando levantei esta manhã, mas acho que tenho mudado muitas vezes desde então."

Lewis Carroll

I'm not there




"Um homem é um sucesso 
se pula da cama de manhã 
e vai dormir à noite,
e nesse meio tempo faz o que gosta".

(Bob Dylan)

"Esta manhã, antes do alvorecer, subi numa colina para admirar o céu povoado, e disse à minha alma: Quando abarcarmos esses mundos e o conhecimento e o prazer que encerram, estaremos finalmente fartos e satisfeitos?
E minha alma disse: Não, uma vez alcançados esses mundos prosseguiremos no caminho."
(Walt Whitman)

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Mais Clarice

Fica sempre um pouco de perfume...

Moradores erguem rosas durante homenagem às vítimas, nesta segunda-feira (25), em Oslo (Foto: Reuters)

"Não importa os motivos da guerra, a paz ainda é mais importante que eles."
Roberto Carlos
Pouco importa a religião seguida pelo atirador da Noruega. O que chama a minha atenção neste atentado é uma nova característica: a falta do semblante perdido e desequilibrado que geralmente todo atirador apresenta. Como mencionou meu querido @neiduclos: "o atirador parece um ator de seriado cult". Eu vou ainda mais longe. Ao ver a foto do atirador pela primeira vez pensei "parece um príncipe encantado do conto dos irmãos Grimm". Ao olhar pela segunda vez a constatação: "não, ele é o príncipe encantado dos filmes do Shrek". Lembram do Encantado e do que ele promove contra o povo de Tão-tão Distante no terceiro filme da série? E o povo fica ali, sem ação, assistindo a toda a encenação de um belo jovem tomado pela loucura.Mas, diferentemente do povo de Tão-tão Distante, o povo norueguês não se fez mais refém do terror do que já foi. Partiu para as ruas, munido de flores e, com atitudes pacíficas, afirmou para o mundo: "somos o país do Nobel da Paz.". Bravo!

Filosofar-drops sobre dinheiro e sustento

Adele cover's Aretha Franklin's 'Natural Woman'

Caminho

domingo, 24 de julho de 2011

Ofício



"Todo ofício é digno quando feito com amor. 
Que o amor nos inspire no trabalho ou nas necessárias pausas." 
(Gabriel Chalita)

Uma lição sobre a verdade - por Nina Oliver

- Mestre, eles não acreditaram em mim. - disse a aprendiz.

- Você contou a verdade? - perguntou o mestre.

- Sim. - respondeu a aprendiz.

- Então isso basta. A verdade não necessita que pessoas acreditem nela para ser verdade. Verdade é sempre verdade. Sempre. - ensinou.

- Obrigada, mestre. - aprendeu.

- De nada.

A suspeita transforma o homem

O folclore alemão conta a história de um homem que, ao acordar, reparou que seu machado desaparecera. Furioso, acreditando que seu vizinho o tivesse roubado, passou o resto do dia observando-o.
Viu que tinha jeito de ladrão, andava furtivamente como ladrão, sussurrava como um ladrão que deseja esconder seu roubo. Estava tão certo de sua suspeita, que resolveu entrar em casa, trocar de roupa, e ir até a delegacia dar queixa.
Assim que entrou, porém, encontrou o machado – que sua mulher havia colocado em outro lugar. O homem tornou a sair, examinou de novo o vizinho, e viu que ele andava, falava e se comportava como qualquer pessoa honesta.

Sol

Pensando as circunstâncias


"Não importa o quão gélido seja o tempo.
O calor em vim sempre vence."

(Nina Oliver)

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Pensando o mistério da escrita


A escrita não tem hora marcada para acontecer, mas quando acontece, marca.
Não sabe ao certo os erros do escrito, mas traz a certeza de que quer ser grafada.
Grafando-se no tempo, torna-se atemporal, eterna. 
É inesquecível, mesmo nas tentativas frustadas do fogo em apagar a tinta.
O que a apaga é a não-existência, o medo de torná-la no que é: a letra grafada.
Eis o mistério da escrita que ganha vida no curso dos traços e
respira a cada curva de letra, a cada palavra formada, a cada sentença criada.
É oração de quem escreve e de quem lê.
É redenção. Missão.
Sem hora marcada. Marca.
Fica grafada nas mãos de quem a escreve.
Fica gravada nas mãos invisíveis da escrita.

(Nina Oliver)

sábado, 16 de julho de 2011

Fernando Pessoa e o vento

Utopia

Poema pintado em letras por Marc Chagall



só é meu
      o país que trago dentro da alma.
entro nele sem passaporte
como em minha casa.
ele vê a minha tristeza
e a minha solidão.
me acalanta.
me cobre com uma pedra perfumada.
dentro de mim florescem jardins.
minhas flores são inventadas.
as ruas me pertencem
mas não há casas nas ruas.
as casas foram destruídas desde a minha infância.
os seus habitantes vagueiam no espaço
à procura de um lar.
instalam-se em minha alma.
eis por que sorrio
quando mal brilha o meu sol.
ou choro
como uma chuva leve
na noite.
houve tempo em que eu tinha duas cabeças.
houve tempo em que essas duas caras
se cobriam de um orvalho amoroso.
se fundiam como o perfume de uma rosa.
hoje em dia me parece
que até quando recuo
estou avançando
para uma alta portada
atrás da qual se estendem altas muralhas
onde dormem trovões extintos
e relâmpagos partidos.
só é meu
o mundo que trago dentro da alma.

Das vantagens de ser bobo - Clarice Lispector

Tela "A vaca vermelha" - Marc Chagall
O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar o mundo. O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo. Estou pensando." 

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia.

O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver. O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.

Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranqüilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado. O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu.

Aviso: não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a célebre frase: "Até tu, Brutus?"
Bobo não reclama. Em compensação, como exclama!

Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu. Se Cristo tivesse sido esperto não teria morrido na cruz.

O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Ser bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não conseguem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em compensação os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem.

Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas!

Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.

A melhor religião - por Dalai Lama

Breve diálogo entre o teólogo brasileiro Leonardo Boff e Dalai Lama


Leonardo Boff explica: "No invervalo de uma mesa-redonda sobre religião e paz entre os povos, na qual ambos participávamos, eu, maliciosamente, mas também com interesse teológico, lhe perguntei em meu inglês capenga: 

-Santidade, qual é a melhor religião?"

Esperava que ele dissesse: "É o budismo tibetano" ou "São as religiões orientais, muito mais antigas do que o cristianismo.

O Dalai Lama fez uma pequena pausa, deu um sorriso, me olhou bem nos olhos - o que me desconcertou um pouco, por que eu sabia da malícia contida na pergunta - e afirmou:
- "A melhor religião é a que mais se aproxima de Deus. É aquela que te faz melhor. "

Para sair da perplexidade diante de tão sábia resposta, voltei a perguntar:
 - "O que me faz melhor?"

Respondeu ele:
- "Aquilo que te faz mais compassivo (e ai senti a ressonância tibetana, budista, taoísta de sua resposta), aquilo que te faz mais sensível, mais desapegado, mais amoroso, mais humanitário, mas responsável...A religião que conseguir fazer isso de ti é a melhor religião..."     

Calei, maravilhado, e até os dias de hoje estou ruminando sua resposta sábia e irrefutável.

quinta-feira, 7 de julho de 2011